Não há nada como assistir um jogo no estádio de futebol e
se for clássico ou final, melhor ainda. Isso é inegável. O clima do jogo, a
cadeia de emoções que podem variar a cada segundo de raiva para alegria, para
decepção e depois alegria de novo. Enfim, inigualável.
Muitos podem falar “ahh mas é violento”, sim, assim como a sociedade em geral.
“Ahhh mas não tem estrutura”, já falei sobre isso aqui, mas mesmo com, em alguns casos, a falta de estrutura, a emoção geral de ir para uma partida (salve exceções) compensa. Já
escrevi sobre torcidas e futebol algumas vezes (aqui, aqui e aqui). Porém,
abordei mais precisamente o assunto “torcidas” no texto, “ Torcida no Brasil não serve para nada” de dois anos atrás. E é meio baseado nele que falarei
hoje, porém fazendo uma mea culpa.
O tempo passa, a gente evolui (ou não), e sinceramente
discordo de muito do escrevi tempos atrás. Torcida no Brasil serve sim e não há
como “comparar torcidas”. Sabe-se lá porque se criou uma “áurea” sobre a
torcida argentina, alemã ou inglesa. Deve ser pelo conceito, do qual compartilhava, de que
“eles sim sabem torcer”, motivo: apóia o jogo todo, canta, etc. Ok. Acho lindo, um bom exemplo. Todavia, não significa que ela seja “melhor” que a
brasileira (ou qualquer outra). Dizer isso é maximizar aquele pessoal que gosta de ser “caga-regra” de como torcer. Não
tem aquele cara chato no estádio que fica falando: “Se for pra ficar sentado
vão para casa. Tá aqui para torcer, etc. etc.”, ou seja, que acha que o torcedor deve agir igual a ele, pronto, é bem isso.
Você dizer que “há um jeito certo de torcer”, é mais ou
menos dizer que “há um jeito certo de expressar sua emoção”, e pior, de certo
modo ainda interfere em direitos básicos de comportamento, até porque, se eu estou pagando para ir a um jogo de futebol, no campo, não atacando ninguém
(fazendo algo “fora da lei”), posso fazer o que bem entender, gritar, chorar,
dormir, levar um porco (ta, aí não sei). O importante, óbvio, é o estádio estar
cheio (e aí sim a gente pode discutir o papel da torcida brasileira na média de públicos).
Até porque poderíamos ver o lado "ruim" desse apoio incondicional, exemplo: Jogo
entre Middlesbrough (Boro) x Manchester City em 2008, 7 (SETE!!!) a 0 para o Boro e, aos (mais ou menos) 35 do segundo tempo, o City faz um
gol, o que a torcida (sim, ainda tinha torcedor do City em campo), faz?
COMEMORA! (ver a partir de 1min e 40)... Sério que isso é um “grande exemplo de apoio?”. Sinceramente, na
minha terra, seria outra coisa. E esse é apenas um exemplo de vários outros
casos, ontem mesmo, Bayern sendo humilhado pelo Real Madrid em casa e a
torcida... ...Comemora, canta!... Por quem? Por que? Sinal de “amor
incondicional” ou seja, "estamos lá nos bons e nos maus momentos", pode ser. Mas, o que de fato isso pode
interferir na grandeza do time ou no resultado da partida. E além disso, desde
quando “amor” significa apoiar incondicionalmente? Amor também pode aparecer em
atitudes como chorar, se calar ou até mesmo reclamar, xingar... Claro, chegar a
pontos como agressão (algo que não ocorre só no Brasil), está completamente
fora de qualquer atitude “aceitável” de um torcedor.
Enfim, seja sentado, cantando ou como os japoneses, fazendo "ohhhhh..." para qualquer passe certo, o importante é, como diria aquele velho clichê, "a festa das torcidas no estádio", porém, cada um ao seu modo, pois, parodiando o Conde do Brega: “A
liberdade ta aí... ta aí...". "A torcida paga ingresso para ver o time vencer. Quem quiser ver espetáculo que vá ao Teatro Municipal." Muricy Ramalho.
Esses dias reli uma das entrevistas mais interessantes que já vi de uma
pessoa no meio do futebol, realizada pelo promissor técnico Fernando
Diniz, ex-jogador do Flamengo, Santos, Fluminense e atual treinador do
Grêmio Audax. Nela, entre outras coisas, se destaca: "Eu sofria muito quando era jogador. Não fui um cara que
teve felicidade de ser jogador. Era uma coisa que era pra eu adorar, mas
esse ambiente profissional de alto nível me trazia muita angústia e
sofrimento”.
“O ambiente do futebol profissional trata os
jogadores como máquina e ignora seus sentimentos. E não colabora para
que eles se desenvolvam politicamente e culturalmente. Ignora esse lado e
o que eles pensam”.
"Querem que você seja uma máquina. Ninguém
sabe o que você acha, porque acha, porque você sofre, e o que pode ser
feito para melhorar sua situação. O futebol não é um meio que favorece a
humanização das pessoas. Tem que se mexer em um núcleo social, o
jogador não é uma máquina feita para só ganhar e dinheiro".
"Geralmente o jogador, quando é criança, vem de uma família
desestruturada. Muitos jogadores saem com 12, 13, 14 anos de condições
adversas. Tudo isso faz com que ele não tenha poder de se articular, por
exemplo. E o futebol e os clubes não levam isso em consideração. O
jogador é tratado como objeto" .
É evidente que por ser um técnico fora da mídia, de um clube que na
época estava na segunda divisão de São Paulo, a entrevista pouco
reverberou. Daí nota-se a importância de um movimento como o Bom-Senso
FC (ver) ser
liderado por jogadores “midiáticos”, já que, muito do que Diniz destaca é
levantado pelo grupo ou você pode encontrar no livro do “líder”, Paulo
André (http://www.pauloandreoficial.com.br/site/livro/). Mas, o foco do assunto não é o Bom-Senso (como grupo) e sim os pontos levantados pelo Diniz.
É interessante ouvir um ex-atleta falar: “Eu sofria muito quando era jogador. Não fui um cara que teve felicidade de ser”.
Ao comentar isso, ele destaca algo que muitos outros podem estar
passando que é o fato de “não gostar de sua profissão” e por isso,
sofrer. No "mundo normal" muitas pessoas passam por alguma profissão ou
empresa que não gosta e onde é infeliz, e isso é totalmente "aceitável" e
compreensível. Todavia, por ter uma áurea, diria, “romantizada”, o
jogador de futebol meio que perde esse direito. Mesmo que 82% dos
jogadores no Brasil (ver)
recebam no máximo dois salários mínimos, nos acostumamos a achar que a
profissão é uma maravilha, que, como diria o clichê: “eles são pagos
para se divertir” ou “eles são pagos para correr atrás de uma bola”,
deixando de lado questões como: distância da família, péssima condição
de moradia (em times pequenos e até grandes), pressão interna do clube,
pressão de empresário, etc.
Só para ficar em um exemplo, falando por experiência própria inclusive. É
horrível ficar sem receber na data correta, chegar no fim do mês e não
ter o salário. E por mais que você seja profissional é impossível um
dado momento não vir na sua cabeça coisas do tipo: “como eu vou pagar
aquela conta?”, e isso não afetar seu rendimento. No entanto, quando
isso ocorre com jogadores de futebol que muitas vezes ficam 2...3...4
meses sem receber e por isso “não se esforçam”, são tratados como
“mercenários” ou pior, “estão lá roubando o dinheiro do clube”, pouco se
leva em consideração se eles realmente não estão “se esforçando” ou se
há uma barreira, até psicológica diria, para isso. Poucos tentam se
colocar no lugar. Apenas cobram "profissionalismo", em um ambiente que
muitas vezes não é profissional.
E aí entramos no segundo trecho da entrevista do Diniz. “O ambiente
do futebol profissional trata os jogadores como máquina e ignora seus
sentimentos. E não colabora para que eles se desenvolvam politicamente e
culturalmente”. Muitos podem falar, “ahh mas o jogador ganha muito”. Como
mostrei antes, essa não é a realidade, mas, mesmo se fosse, isso é
motivo para que sua vida pessoal seja castrada? Só porque um jogador
ganha 500mil, 600mil, etc. ele deixa de ter pai, mãe ou alguém que tenha
apresso. Eles deixam de ter problemas de relacionamento? Eles ficam
imunes a problemas com álcool, drogas, etc. Dá para dizer que o dinheiro
compra “equilibrio psicológico”?.
Pegando alguns exemplos de jogadores que “se perdem” (Adriano talvez
seja o maior atualmente), dá para ver que isso ocorre frequentemente.
Porém, ao invés de se tentar levar em consideração o lado humano, o que
acontece muitas vezes, por parte da mídia e torcedores é a
culpabilização da vítima, ou seja, o “milionário jogador” que é
“pingunço”, “irreponsável”, “vagabundo”, etc. A culpa é dele e pronto.
Como destaca o Fernando Diniz: "Ninguém sabe o que você acha, porque acha, porque você sofre, e o que pode ser feito para melhorar sua situação".
E isso nos leva a última declaração pontuada no texto. "Geralmente o
jogador, quando é criança, vem de uma família desestruturada. Muitos
jogadores saem com 12, 13, 14 anos de condições adversas. Tudo isso faz
com que ele não tenha poder de se articular, por exemplo. E o futebol e
os clubes não levam isso em consideração. O jogador é tratado como
objeto”. Falando em relação ao Brasil, infelizmente o futebol é a
principal via para um moleque pobre de comunidade se tornar “alguém na
vida”. Por isso, se você é um negrinho da favela muitas vezes já nasce
com a responsabilidade de ter “ginga nos pés”, ou seja, já não basta à
vida (meio social) limitar suas escolhas, ele também impõe o que você
deve escolher. Porém, como a maioria não acontece (como jogador), se
torna mais um "qualquer" no meio de tantos.
No entanto, mesmo o que consegue chegar em um time profissional, pode
muito bem não ser feliz. Usando uma frase do autor do título (Nietzsche): “Você vive hoje uma vida que gostaria de viver por toda a eternidade?”.
O fato de ser um jogador (algumas vezes famoso) não significa que ele é
o que gostaria. Ele apenas escolheu essa profissão porque ela era uma
das poucas oportunidades dele ascender socialmente. Mas, lá no início
ele muito bem poderia querer ser jornalista, médico, engenheiro, etc.
mesmo que ganhando menos. Ou seja, não foi ele que escolheu sua
profissão (o que, convenhamos, influi diretamente na sua vida), o meio
que “lhe obrigou” (entre aspas), a ser jogador. Eu ganharia muito mais
sendo médico, piloto de Fórmula 1 ou ator de filme pornô. Mas, mesmo se
conseguisse, essas profissões (entre tantas) não me trariam felicidade
ou realização. E mesmo o dinheiro que poderia vir a ganhar não
compensaria. E assim é com diversas pessoas. Mas, por que com jogadores
deve ser diferente?
É evidente que os jogadores não são uma "classe especial" ou apenas eles
sofrem com empregos ruins, etc. Pelo contrário, por mais glamour que
ser jogador possa ter, eles são apenas mais alguns "operários", entre
tantos, que trabalham "por trabalhar", sem prazer, apenas por
"sobrevivência" ou por falta de "algo melhor". E também, é óbvio que o
mundo do futebol não é composto integralmente por jogadores “socialmente
abalados”, é claro que todos possuem seus erros, muitos são
negligentes, irresponsáveis, etc. Porém, a questão é que, assim como
qualquer pessoas “normais”, isso acontece porque eles são: humanos,
demasiado humanos.
Antes que você cometa o erro de ser o motivo da minha crítica na postagem já adianto que, assim como os livros de Augusto Cury, o título não corresponde ao que está escrito. Eu não sou petista, nada contra e sem preconceito, tenho até amigos que são.
Eu compreendo de boa a opção “sem partido” das pessoas, do: “eu voto na pessoa e não no partido”, ou até mesmo o “prefiro votar nulo”. Ok. Também entendo a “crise de representação dos partidos” que, para muitos, motivou os protestos ano passado. Até aí, beleza. No entanto, o que vejo pelas minhas andanças pela internet e “no mundo real” (adoro separar a internet do ~mundo real~) é uma certa ojeriza a quem é partidário. Meio que: “Nossa. Sério que você petista? que ridículo!”. E aí caímos em críticas ad hominem e generalizações das mais bizarras. Tipo, se a pessoa é petista logo ela é: “mensaleira”, “burra”, “alienada” e defende uma ditadura comunista no Brasil. Não creio que seja lá muito justo esse tipo de generalização.
Assim como no futebol existem torcedores fanáticos que não conseguem enxergar nada além do seu time, na política, o mesmo ocorre com partidários (de todos os partidos), porém, isso não pode ser tomado como se fosse regra. Por mais que exista a “crise da representação”, os partidos continuam sendo influentes e importantes em nossa (nossa!!!) democracia, sendo assim, o partidarismo nada mais é do que uma opção, que gosto de entender como pessoal, de um modo/maneira de viver a política, mas, isso não impede, até onde sei, a pessoa de raciocinar por si só e saber separar as coisas. O fato de alguém ser petista não significa que ele vá concordar com todos os rumos que o partido tome e que apoiará todos os (vários) erros do PT. Ser partidário não significa, em geral, não ter senso crítico.
Cito o PT por ser atualmente o partido mais emblemático. Porém, o mesmo vale para os demais. O fato de alguém ser filiado ao PSDB não significa que ele seja um: “tucano entreguista que defende a privatização total do Brasil pelos Estados Unidos”, o fato de alguém ser do PMDB, não significa que ele apoie o Sarney, ou que todos do PSTU desejam uma revolução comunista através das armas. Generalizar e singularizar algo tão complexo (e bota complexo nisso) que são os partidos políticos no país, apenas enfraquece o debate e maior conhecimento sobre esse, diria, meio social. E “idiotizar” qualquer partidário sem ao mínimo lhe dar o direito de expressar sua opinião, como alguém que consiga raciocinar por si só, é... digamos... um pouco anti-democrático (irônico, não?).
E isso não vale apenas para os "comuns". Outro fator importante nesse meio todo é o partidarismo da imprensa. Dizer que a imparcialidade é uma lenda, para quem estuda comunicação, é quase uma unanimidade, todavia, isso não significa que se determinado grupo de comunicação, ou mesmo pessoa, que assume ser partidário, será automaticamente um “vendido” e qualquer tipo de informação passada por esse meio (ou pessoa) não deverá ser levada em consideração. Existem diversos jornalistas que não são partidários, porém, são extremamente mercenários (olá, tudo bem?), e outros que mesmo assumindo “ser de um lado”, conseguem fazer seu trabalho da forma mais coerente possível. E aí cabe curiosamente a muitos que criticam a “cegueira” de quem é partidário, saber minimamente refletir, sem qualquer tipo de pré-conceito, sobre o que é uma informação coerente (esqueça a imparcialidade) e uma totalmente manipulada (adoro essa palavra, nunca sai de moda).
"A liberdade para os partidos é uma coisa, e essencial; o governo pelos partidos outra, e dispensável". Agostinho Silva.
Meus pais não gostam de futebol. Por isso, não nasci numa casa com o “convívio social” propenso a gostar do esporte. Mas, é aquilo, sempre tem um tio (no meu caso dois) que leva você para o “mau” caminho. Nesse caso, ser torcedor do Sport (admitam, poderia ser pior).
No entanto, o assunto não é como me tornei, e sim, como era, quando criança, ser torcedor. Comecei a gostar do esporte (e do Sport) lá pelos anos de 98, 99... E nessa época, até por ser goleiro no mirim-a do meu colégio, era fã doBosco (ex-goleiro do Sport). Para mim ele era o maior goleiro do mundo (apesar de que, de fato, ele era um dos melhores do país). Eu nunca tinha ouvido falar no Schmeichel (dinamarquês do Manchester United, em tese, o melhor naqueles anos), no Oliver Kahn que já se destacava no Bayern, Pagliuca ou até mesmo no Taffarel, esse último, só na Copa de 1998. Na minha “inocência”, o maior do mundo era o Bosco (e aí de quem duvidasse), vibrava com suas defesas e quando fazia as minhas, claro, não titubeava em gritar “Defende Bosco!!!”. Sim, eu queria ser ele.
O tempo passou, comecei a gostar e acompanhar mais o futebol nacional, estrangeiro, história, jogos antigos, etc. Enfim, fui me “especializando” no tema. E hoje, óbvio, rio da minha antiga ingenuidade. E apesar de ser muito fã do Magrão (atual goleiro do Sport), não diria que ele é o “melhor do mundo” (mesmo sendo melhor do que foi o Bosco e um dos melhores do país).
Porém, aí que está a questão...Vivemos no “mundo da informação”, hoje é bem mais fácil ter acesso a notícias de times e jogadores de todos lugares do mundo, assistir diversos campeonatos, pesquisar números/estatísticas, história, etc. E isso está criando uma das piores pragas que existe: o “especialista de futebol", arrogante. E o que é isso? É aquela pessoa que “não é clubista” (e se orgulha disso), que gosta do futebol pelo esporte em si (não "torce" para ninguém), acompanha de tudo e entende do riscado (ou acha que entende). Até aí, ótimo, nada contra esse tipo de espectador. Mas o problema começa quando ela acha que o esporte lhe pertence (é quase um elitismo “intelectual”) e passa a ignorar a “inocência” de quem apenas (e tem todo direito disso) acompanha seu time.
Essa pessoa é aquela que fará cara feia quando um torcedor do Santa Cruz (e que se preocupa apenas com o tricolor) falar que o Caça-Rato é o melhor jogador do time (ou do Brasil). “Você não entende de futebol. Os números mostram que André Dias é disparado um jogador melhor”, dirá nosso idiota da objetividade. Se um “torcedor comum” falar que o jogador do seu time (no Brasil) é melhor que o algum jogador do Barcelona, nosso “gênio”, provavelmente infartará... falará que não se compara o nível, que o futebol aqui é uma várzea, que o futebol europeu é o melhor do mundo, etc. Ele está errado? em tese, não. Mas, sua prepotência, sim. Sua tentativa de contrapor o lúdico com o lógico de forma arrogante, é patética.
O mundo do futebol também é lúdico e não objetivo. O do meu time é melhor porque é do meu time e pronto. Eu não me importo com números, nível, etc. não acompanho futebol pelo esporte em geral, acompanho porque gosto do meu time, simples. Ninguém pode ser culpado por não entender a fundo de algo (ser “especialista”). É óbvio que os Beatles são melhores que o Molejão (ou não), mas, eu posso dizer que prefiro o Molejão pelo simples fato de ser o que escuto. Não pretendo ser um “perito” em música, apenas, ouvir o que gosto como uma grande “brincadeira de criança”.
Então, se pudesse voltar no tempo e falar comigo mesmo na época em comecei a gostar de futebol. Além de provavelmente provocar um furacão em Tóquio (ver) e dizer que eu deveria pedir a Márcia em namoro. Me daria um abraço e apenas confirmaria que realmente...O Bosco é o maior goleiro do mundo.
Eu fico com a beleza da resposta das crianças / É a vida, é bonita e é bonita. Gonzaguinha.
Mesmo sendo tratado como algo “inocente e para crianças” o filme “O Rei Leão” traz um discurso político-ideológico bem elaborado. Se fosse crítico de cinema Karl Marx talvez o definiria assim:
Somente se levarmos em conta o advento e a natureza do Estado moderno (poder soberano aplicado sobre toda uma nação), poderemos compreender a função implícita ou explícita da ideologia, sua tentativa para fazer com que o ponto de vista particular da classe que exerce a dominação (política) apareça para todos os sujeitos sociais e políticos como universal, e não como interesse particular de uma classe determinada.
Para não me alongar produzindo um texto que fale sobre todo o contexto político do filme, deixo 3 links (clique nos títulos) que tratam sobre o tema:
Dito isso, vou a parte que interessa, que é, digamos... ...redimir as hienas do perfil “maligno” do qual foram retratadas na produção. E mostrar como dentro do contexto social do reino elas foram as maiores oprimidas.
No início do filme, o monarca absolutista, Mufasa, mostra ao príncipe Simba todas as suas “posses” (o reino), porém, deixando claro que ele evite o lugar sombrio (cemitério dos elefantes), onde de forma reclusa vivem as hienas. Algo que para muitos (como é dito no texto“Tirania de Mufasa”) pode ser visto como um Apartheid.
Além de, a princípio sem muita justificativa, não viverem no melhor local do reino, as hienas passam por outro (e o mais sério problema): a fome (além de outras injustiças), que é bem retratado no trecho mais simbólico do filme (caso o vídeo não abra abaixo, clique aqui):
No vídeo Scar deixa bem claro: “Fiquem comigo. E jamais sentiram fome outras vez!!!". Pouco antes, as hienas reclamam de estarem “na rabeira da cadeia alimentar”, o que não tem sentido algum por elas serem carnívoras. Ou seja, já que a definição biológica não explica, talvez Marx explique, dizendo que: "O Estado (O Rei Leão) aparece para representar os interesses da classe dominante e cria, para isso, inúmeros aparatos para manter a estrutura da produção. Esses aparatos são nomeados de infraestrutura e condicionam o desenvolvimento de ideologias e normas reguladoras, sejam elas políticas, religiosas, culturais ou econômicas, para assegurar os interesses dos proprietários dos meios de produção".
Mas por que as Hienas? A explicação mais óbvia para isso é que elas são vistas como um “competidor natural dos leões”. Ambos são os carnívoros de maior destaque do filme (apesar de existirem outros). Dá para subentender isso ao ver que durante o reinado de Mufasa (e posteriormente de Simba), pouco se fala sobre a “obrigação da caça” dos leões, eles vivem em perfeita tranquilidade, sossego e paz. Talvez porque, possuem comida em abundância e com fácil acesso (o texto Anobre família leão e as hienas retrata isso de forma interessante).
No entanto, quando as hienas voltam ao reino (através de Scar) a obrigação da caça passa a existir para os leões (no caso, as leoas). Ou seja, a imagem que fica é que, numa espécie de “darwnismo social” os leões (através do seu rei) veem a necessidade de segregar as hienas para, em tese, manter seu “status” e a boa vida. Ou seja, vai além até dos limites do capitalismo (da livre concorrência) e passa a ser tirania e absolutismo puro: “o reino pertencerá a você, Simba”.
A aproximação das hienas a Scar é mais do que justificada quando ele promete (como pode ser visto no vídeo acima): “Fiquem comigo. E jamais sentiram fome outras vez!!!”
“Injustiças farei com que parem” "Uma nova era onde leões e hienas conviveram juntos"
Convenhamos que quando se está segregado, com fome e “abaixo da cadeia alimentar”, qualquer promessa ou o mínimo de interesse por sua causa será bem vinda. Vale lembrar que antes de propor a união (o que, em tese, traria a ideia de verticalidade), Scar leva comida para as hienas.
Seria possível dizer que elas pensavam (a princípio) em uma revolução plena que: “Conduziria à ditadura do proletariado, ou seja, o proletariado, em luta contra a burguesia e através da revolução, transformar-se-ia em classe dominante”. Isso pode ser visto quando elas clamam: “Morram os reis!” (sendo posteriormente repreendidas por Scar). Ahhh sim. No vídeo, o fato delas marcharem como fileiras sovietícas é apenas ilustrativo, certo? (risos)...
Porém essa revolução a princípio vitoriosa quando elas derrotam o rei (segregador) e voltam a conviver com todos os animais do reino (no início do “governo Scar”), passa, infelizmente para hienas, a não surtir tanto efeito, já que elas saem de uma monarquia absolutista para uma espécie de ditadura (não do proletáriado). Digamos que não há a ruptura necessária. Tanto que um dado momento, quando voltam a passar fome, as hienas contestam o governo do “Rei Scar” o comparando com o antigo rei.
Alguns podem colocar a culpa da debandada dos outros animais e da pobreza do reino, durante o reinado de Scar, na incapacidade das hienas. Algo que não tem muito sentido. Primeiro: Qual a culpa das hienas na falta de água ou de plantas? Quando viviam no sombrio e isolado cemitério dos elefantes elas não faziam por opção e sim porque eram obrigadas pelo rei Mufasa.
Outro ponto importante é que quando lá vivam elas já possuíam uma grande população, então, mesmo passando fome, sobreviviam e se reproduziam, ou seja, subentendesse que se alimentavam (mesmo que pouco), sem afetar ou fazer com houvesse debandada. Há ainda a teoria que elas comiam a si próprias, difícil acreditar, mas, se fosse verdade, apenas justificaria mais ainda sua revolta.
Vale lembrar que no início do filme Mufasa fala para Simba sobre a importância de “manter o equilíbrio do reino”. Mas, como pode-se manter o equilíbrio se uma parte importante do nicho é segregada?. Como diria Josué de Castro: “O que falta é vontade política para mobilizar recursos a favor dos que têm fome”.
As hienas não são nada mais do que a resposta de quem está marginalizado socialmente. Mais uma vez citando Josué de Castro: “A verdade é que os povos chamados subdesenvolvidos já se aperceberam da profunda contradição que existe entre os preceitos morais de igualdade, fraternidade e humanitarismo, pregados e defendidos pelos teorizantes da civilização ocidental e a crua e cínica disputa pelo lucro a que se entregam os grupos mercantilistas dominantes nos países bem desenvolvidos e industrializados do mundo”.
Elas simbolizam uma massa (que era grande) que estava cansada de passar fome, de ser a “paria social” (mesmo sendo forte), e apesar de participarem da revolução, não demonstraram apresso pelo poder, se fosse, elas poderiam governar (de fato) durante a “era de Scar”. Também nunca demonstraram a intenção de perseguir ou segregar seus inimigos. É interessante perceber que durante o reinado de Mufasa as hienas eram segregadas, porém, durante o reinado de Scar (em tese com participação das hienas), os leões não sofrem represálias (todos convivem juntos).
Essa demonstração de desapego ao poder e uma identidade de comunidade pode ser notada quando elas são tratadas abertamente como inimigas por Scar (quando esse as culpa pela morte de Mufasa) agem como inimigas contra ele, ou seja, elas estavam desapegadas de algum aparato ideológico. Em suma... apenas buscam “não passar fome” no reino da abundância. É... hakuna matata, para elas, é pura utopia.
Por fim, talvez o que mais redima as hienas seja o Rei Leão II. Nele, elas não aparecem, o reino é dividido entre “o reino de simba” e os “exilados de Scar”, porém, todos são leões. Na história dizem que as hienas fugiram. Mas, para onde? O fato de fugir, ou seja, o êxodo territorial, é algo muito comum em sociedades oprimidas. Foi assim na Ucrânia (e países do cortina de ferro) durante o regime soviético, foi assim com os judeus na Alemanha nazista, com os negros nos Estados Unidos (principalmente no sul), etc.
A forma como as hienas (ahhh sim, por sinal, o nome das três principais é: Shenzi, Banzai e Ed), lembra muito uma frase dita por Malcolm X: “Se você não cuidar, os jornais farão você odiar as pessoas que estão sendo oprimidas, e amar as pessoas que estão oprimindo”.