terça-feira, 2 de abril de 2013

O que seus olhos Veem?


Estava voltando tranquilo, no ótimo (sem ironia, é bom mesmo) ônibus municipal para minha casa após um dia cansativo de trabalho/curso, quando ao lado da minha janela para uma espécie de Micro-ônibus da Polícia com presos dentro. Um deles, ao me ver observando o veículo abre um sorriso e faz gesto de cumprimento, prontamente respondo com a mesma atitude. E aí tem início um dos fatos mais interessantes da minha desinteressante vida.

Ao me ver gentilmente cumprimentar um preso, um conhecido que estava ao meu lado demonstra um certo desconforto e me indaga sobre minha atitude:

- É amigo de bandido agora, é? – comenta com certa ironia.

- Que bandido? Apenas vi uma pessoa me cumprimentando – respondo, com uma certa surpresa da reação do conhecido.

- Como assim “uma pessoa”? É bandido, cara. E se ele fosse a pessoa que, por exemplo, tivesse matado sua mãe, você cumprimentaria? – Questiona, crente que tinha dado um “xeque-mate”.

- Ué? Se fosse, ele seria a pessoa que matou a minha mãe e não “apenas” um bandido ou pessoa, teria uma conotação totalmente diferente em minha vida. Porém, se caso ele fosse o assassino e eu não soubesse, aos meus olhos, continuaria a ser apenas uma pessoa me cumprimentando. Por exemplo, o assassino da minha mãe, seguindo a lógica que você sugeriu, poderia ser meu pai e se eu não soubesse, continuaria a tê-lo como um grande exemplo.

Achei que tinha encerrado o assunto. No entanto ele divagou, pensou um pouco e continuou a discussão.

- Beleza. Veja bem, ele é um bandido, então, pense assim. E se ele tivesse matando uma pessoa nesse momento e lhe cumprimentasse, você responderia?

- Bem. Se isso ocorre. Ele passaria de uma pessoa, ou melhor, uma pessoa dentro de um carro me cumprimentando, para uma pessoa cometendo assassinato e me cumprimentando (risos) ou seja, eu teria um maior embasamento para julgá-lo, até porque sua atitude (de matar alguém) poderia ter alguma motivação justa. Por enquanto, aos meus olhos, ele é apenas uma pessoa, dentro de um carro, que me cumprimentou.

Ele passa quase um minuto em silêncio e decide, digamos, “apelar”.

- Ahhh tá. Então e se ali fosse um carro funerário, e levanta uma pessoa do caixão e lhe cumprimenta. Você responde de boa? Tecnicamente, aos seus olhos, seria “apenas” um pessoa lhe cumprimentando. E aí?

Entre risos e a duvida se ele tava falando sério ou já tinha passado para o nível “zorra total” de discussão, resolvi responder.

- Pô, cara. Muda de panorama né? Não é uma “pessoa” me cumprimentando e sim um zumbi ou Jesus Cristo... Enfim, mesmo assim, em ambos os casos eu responderia o cumprimento, sim.

Vendo que não tinha mais o que questionar ele resolve deixar claro o seu posicionamento.

- Bem, eu não vejo-o como uma “pessoa”, e sim um bandido. Vejo um preso, ele não é uma pessoa comum para mim. Diria que coloco o fator “local onde está”, ou seja, a prisão, na frente do fator “pessoa”.

Resolvi não prolongar a discussão, também não puxei outros assuntos, fui ouvir música até o término da viagem. No entanto, não poderia deixar de ficar pensando em como aquilo me tocou. Tipo, por mais que eu ache preconceituosa/estereotipada a forma de ver as pessoas dele, era a sua “visão de mundo”, ou seja, deve haver toda uma carga social por trás disso. Então eu poderia julgá-lo? Se fizesse não estaria sendo igual a ele? ... ...Enfim... E o que eram respostas seguras, virou duvida...


Não vou postar a já tradicional frase final e sim, a música "O que seus olhos Veem?" de Facção Central>  http://letras.mus.br/faccao-central/311917/

segunda-feira, 1 de abril de 2013

A minha (e apenas minha) ótima infância


Não tem quando você fica com vergonha de ser algo pelas atitudes dos seus “iguais” (tipo ser palmeirense hoje em dia). Então, eu, como bom nostálgico, me sinto exatamente assim, com muita vergonha alheia, quando vejo “semelhantes” compartilharem e realmente acreditarem que sua infância foi melhor ou que “as crianças de hoje não tem infância” (alguns exemplos)

É claro que eu adorava assistir (ansiosamente) Dragon Ball Z para ver o planeta Namek explodir (em curtos 20 episódios), é óbvio que foi mágico virar o Metal Slug no fliperama usando apenas 3 fichas, isso sem falar do Winning Eleven 2002, e é evidente que minha infância foi muito melhor sendo um “rato” no Tazo. Porém, isso foi a minha infância e “apenas” isso e assim como ela não foi pior do que a de ninguém, também não foi melhor. 

Bancando o psicólogo (se o Malafaia pode, eu também posso) só imagino duas coisas que leva a pessoa a ter esse tipo de atitude nostálgica. Pensando positivamente seria o fato dela ter uma infância tão boa que em sua visão a de todos deveria ser igual. Claro, ela erra, pois o conceito de “ser bom” difere entre pessoas, existem pessoas felizes por torcerem pelo Sport e outras (pasmem) igualmente assim por serem torcedoras do Santa Cruz. Outra hipótese, a negativa, seria que a pessoa é um adulto tão medíocre que precisa lembrar da sua infância para ter algum parâmetro de algo “positivo” em sua vida. Igualmente errado. 

Ai vem os argumentos... “ahhh mas a tecnologia está isolando as crianças, hoje elas não brincam mais na rua ou com os amigos na escola”. Curiosamente a escola e a “rua” continuam existindo, porém, também curiosamente, à tecnologia "não existia" na época de quem pensa assim. E mesmo assim, boa parte desses “anti-tecnologia” são os mesmos que faziam qualquer coisa (e quando digo qualquer coisa é qualquer coisa mesmo) para poder jogar Play1 na casa do amigo, ou que sentia inveja do garoto que tinha celular na 7° série. Isso sem falar daquele carrinho de controle remoto que fazia com que escondessem o seu de lata (nada contra, eu particularmente adorava meu camiãozinho de lata, mas, aquela Ferrari de controle tinha lá seu charme). Outra coisa interessante nas pessoas “que tiveram infância” e que hoje se preocupam com as “crianças isoladas pela tecnologia”, é que não pensavam assim à época, quando não estavam nem ai para a garota gordinha isolada, ou para o rapaz mais tímido que não tinha amigos, ou mesmo (no caso das garotas) para aquele menino, pobre, mas simpático que sempre era preterido pelos “mais descolados” (pausa para chorar)... ...Enfim, não creio que as crianças hoje sejam “isoladas pela tecnologia”, até porque não precisa estar perto para estar junto. E se muitas ainda estão isoladas, estas são as mesmas que já existiam no passado, e pior, não tinham à tecnologia. 

Outro argumento interessante é a falta de coisas boas na atualidade, claro, no “passado maravilhoso” não existia Restart, Beleza! Nem vou discutir o público que o Restart busca atingir e tals. Mas, no “passado maravilhoso” existia Twister, lembram? (a analogia não é minha, porém também não vou dar os créditos), será que melhorou muito? “ahhh mas hoje não tem mais Mamonas Assassinas”...Assim... ...Eu até gosto de Mamonas Assassinas, no entanto, se esse é o parâmetro de “melhor infância”, sinto lhe dizer: você também não teve infância; E isso sem falar que graças à “malvada” tecnologia as crianças de hoje tem a oportunidade de ouvir Mamonas Assassinas, músicas da década de 80...70...60... etc. Ou seja, uma opção maior, talvez se os que “tiveram infância” também tivessem tecnologia o gosto seria moldado de uma outra forma.

E a questão da tecnologia também vale para a televisão. As crianças de hoje podem com “facilidade” encontrar tudo sobre todos os desenhos da manchete que você (que “teve infância”) gostava. No entanto, os desenhos que fizeram a infância (creio eu, também feliz) dos seus pais, você só ouvia falar... “ahhh mas os desenhos da manchete e alguns do Sbt e TV globinho eram os melhores”, claro, eram os únicos que você assistia, porque só tinha a oportunidade (meios) de assistir desenhos nesses canais, não tinha lá grandes opções, e assim, até teletubies fica maneiro. 

Outro argumento interessante é quando falam... “ahhh mas as crianças de hoje estão mais mal educadas”... Talvez seja porque os atuais adultos (que “tiveram infância”) não saibam lá educar muito bem. E se as crianças de hoje em dia tem mais acesso a “coisas ruins”, igualmente possuem a “coisas boas”, é só uma questão de orientação... “ahhh mas hoje eu vejo meninas com 13 anos pensando em homens”. Assim... ...Se a gente for lá no passado veremos que provavelmente sua vó talvez tenha se casado aos 13, 14, 15 anos...Mas, pegando algo mais recente, tipo, não é querendo ser chato...Porém, se quando você tinha 13...14...15 anos não notou que as garotas já tinham interesse em homens (ou mesmo em mulheres, enfim), digamos que você era meio “lento(a)”. Isso sem falar que se ela(e) tem mais liberdade para falar sobre sexo, tem mais condições/conhecimento de tomar as “decisões certas”. Vale lembrar que a taxa de fecundidade entre mais jovens vem caindo no Brasil (clique aqui)

Em suma, é isso... Fazendo uma analogia (minhas analogias são ótimas), infância é igual a nossa mãe. Existem pessoas que tiveram péssimas mães ou mesmo não tiveram mães e igualmente é com a infância (e no Brasil isso ainda existe demais). Porém, se você teve uma boa mãe, ela não é melhor (ou pior) que a boa mãe de ninguém. E se sua mãe só sabe fazer macarrão numa panela de barro velha, não significa que ela seja melhor (ou pior) que a minha que faz uma ótima lasanha em um forno moderno... (apesar de que a lasanha da minha mãe é melhor mesmo... ... ...PARA MIM!).


Pode-se ter saudades dos tempos bons mas não se deve fugir ao presente".
Michel de Montaigne